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A mostrar mensagens de abril, 2005

O QUE SE ESCONDE ATRÁS DO HINO DO ALGARVE?

Parece que vamos ter um hino no Algarve. Macário Correia, presidente da Câmara de Tavira e da Grande Área Metropolitana do Algarve, achou que os hinos estão na moda, nos congressos e nas campanhas. Vai daí, não quer ficar atrás da história, abre os cordões à bolsa e resolve lançar um concurso de 2500 euros para a criação de um hino que tenha a palavra Algarve no refrão. O argumento são os valores regionalistas e a imagem de marca cultural do Algarve. Mas apreciemos a coisa. Para justificar a descoberta o autarca lança umas ideias peregrinas sobre o Algarve. A ele parece-lhe que a história do território já está fechada. Depois dos califados muçulmanos passamos a província e depois a distrito. Tempo de ter um hino do distrito. Engraçado que os árabes, que passeavam a sua criatividade musical e artística entre Silves e Córdoba, nunca se tenham lembrado disso. Preferiam a sua veia intercultural, cantando as belezas do mediterrâneo, que afaga o sul da península e todo o Magrebe. Nem mesmo o

José Carlos Fernandes a «A Voz de Loulé»

SEM A MÚSICA CLÁSSICA E O JAZZ, VIVERIA NUM MUNDO COM MENOS UMA DIMENSÃO Esta entrevista já estava pensada há muito. José Carlos Fernandes é daqueles autores de quem não dispensamos leituras: pela verve da sua refinada crítica social; por uma temática ilustrativa universalista; pela cultura musical e literária que jorra das suas micro-histórias. No ano passado deu-nos a honra de colaborar no suplemento cultural [a cultura] que mantivemos neste jornal, legando-nos alguns desenhos cujos traços eram mensagens vivas do seu pensamento social enquanto desenhador. A ele dediquei uma das minhas colunas. O José Batista - que comigo partilha esta entrevista - conhece-o também há muito, e com ele passou muitas horas à volta das histórias da banda desenhada (BD). Por tudo isto preparámos a entrevista com um dos autores mais importantes da BD portuguesa de sempre, numa altura em que José Carlos Fernandes acaba de lançar, no passado dia 23 de Abril, na Biblioteca Municipal de Loulé, o seu mais rec

Vieira: um perfil de ética humanista

A propósito das comemorações do centenário do nascimento de José Cavaco Vieira, ilustre cidadão altense, ocorreu-me pensar no também ilustre poeta que abriu caminho àqueles que por obras valorosas se foram da lei da morte libertando. Talvez porque Vieira tenha percorrido todo o século XX, vivendo diversos contextos sociais e políticos, sempre, mas sempre, com um valor intrínseco e elevado: fazer o bem! A sua vida pautou-se por uma multifacetada diversidade histórica, equilibrando diversas dimensões humanas: em primeiro lugar uma dimensão humanista; em segundo lugar uma dimensão comunitária; em terceiro lugar uma dimensão artística eclética; e finalmente, em quarto lugar uma dimensão ecológica e histórica. Iremos ver, de seguida, como contribuiu para este perfil de complexidade. Durante o Estado Novo soube, de forma inteligente, acompanhar as suas obrigações políticas e ideológicas, com uma luta ténue, mas progressiva, em defesa das necessidades do povo da sua aldeia, que sempre amou. Q

Conhecimentos nada obsoletos

José Carlos Fernandes (JCF) é de Loulé. Nasceu e vive por cá. Mas o que interessa, aqui, não é o facto de ser louletano. Não é só por ser louletano que é o que é. Isso deve-o a outro facto. Exactamente por ser um dos melhores autores de banda desenhada portugueses. E coloco a nacionalidade ali, no fim da frase, para torná-lo universal, pois se dissesse autores portugueses de banda desenhada estava a reduzi-lo a um cantinho que produz já mais BD do que a que é lida em Portugal. Estaria a reduzi-lo a uma escrita nacionalista, ou regionalista, coisa que a sua BD não é nem quer. Basta ler um livro qualquer de JCF para vislumbrar isso: uma visão do mundo, fora dos limites de Vilamoura ou da serra do Caldeirão, onde perpassam Jorge Luís Borges ou Mozart, Laurie Anderson ou Coltrane, o jazz e a filosofia, a monocultura da televisão, ou a veia sanguinolenta dos homens (e das mulheres). Mas são desenhos antitéticos, em que também perpassa a paz, uma flor na mão de um puto que procura algo, um a

Teixeira Gomes e a Capital da Cultura

Há dias conversava com um amigo sobre as suas recentes leituras. Dizia-me ele – que organiza as suas leituras melhor do que as suas aulas – que nos últimos dias andou a ler os poetas e escritores algarvios, ou que escreveram sobre o Algarve, dos princípios do século passado: João de Deus, Raul Brandão, Emiliano da Costa e Teixeira Gomes. A propósito deste último autor conversámos sobre o seu excelente conto “Gente Singular”, uma história mágica e verdadeiramente esotérica, passada no centro histórico da cidade de Faro. Uma história cheia de humor, inteligentemente anti-clerical, e de linguagem e conceitos modernos para a época. Nesta sequência, lembrei-me de quão pouca gente conhece este belíssimo autor, de origem portimonense, negociante de frutos secos e presidente da república entre 1921 e 1923. E de como seria importante a Missão Faro, Capital Nacional da Cultura, em 2005, promover um congresso sobre Manuel Teixeira Gomes, ao invés de o fazer sobre António Judeu da Silva “O Judeu”.

Entrevista a Daniel Vieira sobre o Plano de Revitalização de Alte

“ESTOU DESILUDIDO COM O PLANO DE REVITALIZAÇÃO DE ALTE”: Daniel Vieira em entrevista a «A Voz de Loulé» Na aldeia de Alte, no concelho de Loulé, decorre o Plano de Revitalização de Alte, promovido pela Câmara Municipal de Loulé. Depois do “Concurso da aldeia mais portuguesa de Portugal”, pode vir a ser o plano de alteração estrutural mais importante da aldeia, desde então. Para perceber o que está a acontecer, «A Voz de Loulé» foi conversar com Daniel Vieira, lídimo habitante da aldeia, professor e artista plástico, um homem permanentemente preocupado com a imagem arquitectural da sua terra. E sobretudo com a face cultural exógena que ela transmite a quem a visita. «A Voz de Loulé»: A propósito do Plano de Revitalização de Alte, os jornais falam “numa revolução na aldeia de Alte”? O que pensas desta expressão? Eu penso que seria uma revolução se o Plano fosse executado como tínhamos pensado. Quando apareceu a possibilidade de utilizar os dinheiros que o engenheiro João Cravinho referiu

As árvores da Sacadura Cabral

Ainda há uns meses lá estavam, as árvores da Rua Sacadura Cabral. Eram como duas linhas de verde, acompanhando quem subia a rua, deixando passar as nesgas de sol sobre a calçada. Nunca soube que árvores eram. Talvez agora que elas já não estão lá, me interesse o seu nome, saber os anos que tinham, a dimensão da sua copa, a altura do seu tronco. Sei que uma delas tem pelo menos um metro de diâmetro na raíz. Sim, porque a raíz, por onde cresceu e que alimentava de seiva os ramos e as folhas, ainda permanece, depois de decepada, como a base de uma estátua a quem cortaram a cabeça e depois o tronco. Penso em quem teria plantado estas árvores. Quem teriam sido os homens ou mulheres que num dia qualquer de Março, talvez debaixo de chuva, se debruçaram na terra e colocaram - com o afecto paternal destes momentos - uma semente ou uma pequena planta, no seio da terra-mãe? Quem se teria preocupado em cuidar destas dezasseis árvores, alinhadas lado a lado e frente a frente, como um exército que p

O regresso da política aos campos

Ao ler o “Expresso” de 20 de Dezembro e o “Diário de Notícias” de 22 do mesmo mês, atentei na notícia da inauguração de uma biblioteca em Celorico de Basto, no distrito de Braga, a qual adoptou a designação Biblioteca Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa. Esta notícia trouxe-me à memória outras iniciativas, que têm povoado o interior do país - esquecido das políticas centralizadoras de desenvolvimento – de nomes sonantes da política, das artes e das letras. Por um lado, mostra que a nossa ancestralidade comum – dos que vivem nas cidades e dos que vivem nos campos - tem origem nos territórios agrários, dos tempos das economias agro-pastoris, antes do abandono da agricultura, do fenómeno da desertificação populacional e ecológica, do envelhecimento dos campos e da macrocefalia política, económica e demográfica. Por outro lado, mostra que a forma que a nomenclatura política encontra para colmatar e resolver estes males, são o regresso das marcas do poder central, ao campo: nomes, dádi