Manifesto Contrasensus

Esta coluna completa, hoje, dois anos. A 1 de Maio de 2003 publicava um texto sobre José Cavaco Vieira, escrito de forma compulsiva aquando do conhecimento do seu fenecimento. A partir daí este pequeno espaço, em «A Voz de Loulé», passou a ter um nome: “Contrasenso”. Uma forma criativa de grafar a palavra contra-senso, muito equilibrada e estável para o meu gosto. Condições que esta coluna pretendia perturbar, na sua missão de questionar, de criticar, de interrogar. Durante estes dois anos muitos formatos passaram por aqui. Textos de pesquisa sobre literatura, poesia e educação; textos de crítica social, política ou cultural; pequenos posts sobre futebol, política, livros ou poetas. Aos leitores nunca pretendi ser indiferente. Provavelmente agradei a poucos e desagradei a muitos. Mas é essa a função dos colunistas. De textos vulgares, espécies de encómios políticos ou encomendas literárias - que nada adiantam a quem os lê – estão os jornais cheios. Esses nem os leio de tão vazios e politicamente correctos que são. Abrir as cabeças para o que está para além das palavras, perceber as mensagens subliminares da política, da cultura e do social é o desvelamento que o colunismo social deve fazer. Por isso nunca me alinhei pelo recorte ideológico de qualquer partido, ou pela patrulha cultural de qualquer cartilha. Mas também nunca me escondi por trás de pseudónimos ou em cartas anónimas. Sempre dei a cara no que escrevi aqui, ou no jornal «barlavento» para o qual sou habitualmente convidado, ou mesmo para o «Público», onde às vezes publico.
Algumas das minhas últimas colunas têm obtido ecos de resposta de alguns visados. A nenhuma irei responder, a não ser que se ultrapasse a dignidade do debate. As palavras que se escrevem ficarão, sempre, com a marca de quem as emite. As polémicas serão a colheita dos leitores a quem cabe pensar e reflectir. Esta é também uma forma de “medo de existir”, na acepção de José Gil: o receio da crítica, o medo da polémica, o esconso do debate. O medo da partilha e do conflito social e cultural manifesta-se no desagrado com que se recebe a opinião alheia, veiculada por jornais ou por outras formas de media. Talvez devessem conhecer melhor o peso da opinião de alguma imprensa nacional ou internacional. E não ficar nesta modorra provinciana do jornalismo do burgo, no qual, quase sempre a crónica, a opinião, a coluna é comprada ou encomendada a assessores ou gabinetes. Onde a liberdade não existe. A verdadeira liberdade de pensamento e de opinião. O meio é pequeno e provinciano? Talvez! Mas mais ainda, é tão púdico que não aceita palavras como “merda”, em entrevistas ou manifestos. Bem, talvez devessem ler Camilo e Eça, Cesariny e Pacheco. Ou o poeta beatnick - um dos maiores da sua geração - Allen Ginsberg e um dos seus mais conhecidos poemas: “Merda”.
Como diz Mia Couto, na sua crónica no «Courrier Internacional» de 15 de Abril, “os verdadeiros inimigos (...) moram na sua cabeça, são fantasmas que nunca serão aplacados. Derrubados uns, nascerão, de imediato, outros”. Muitos terão fantasmas perenes. Pois é. É para isso que os colunistas servem: afastar os fantasmas. Enquanto eles perdurarem, nunca cumpriremos a palavra. A mais bela de todas: a liberdade.

A partir de hoje iniciarei um formato sui generis nesta coluna: o convite a gente que pensa e escreve para, comigo, partilhar este espaço que se quer público e pluralista. A minha participação passará a ser mensal, no dia 1 de cada mês. Os convidados estarão sempre no jornal dos dias 15. No próximo número teremos aqui o meu primeiro convidado: Luís Guerreiro.
[coluna de 1 maio 05]

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